“A universidade está ameaçada de fechar por não conseguir pagar suas contas”, diz reitor
Afirmação foi feita durante coletiva da Andifes sobre o corte de mais de 18% no orçamento das universidades federais
Texto: Ana Paula Vieira
Foto: Reprodução/Youtube Andifes
A Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), presidida pelo reitor da UFG, Edward Madureira, realizou uma coletiva de imprensa na manhã desta quinta-feira (18/3), sobre o corte de mais de 18% do orçamento das Universidades Federais.
Na abertura da coletiva, Edward enfatizou a importância das instituições no combate à pandemia de covid-19. Ele citou algumas ações, como campanhas de solidariedade, produção de EPIs, pesquisas sobre a doença, testes de novos medicamentos e atendimento nos 45 hospitais universitários. “A universidade pública brasileira não parou um momento sequer. Temos algumas vacinas em fase bem adiantada, pelo menos quatro bastante promissoras. Essa universidade que se encontra agora numa situação extremamente delicada do ponto de vista orçamentário”, ressaltou o reitor.
Segundo Edward, em 2019 o orçamento para a manutenção das 69 federais foi da ordem de R$ 6 bilhões. Em 2020, houve um decréscimo de cerca de R$ 500 milhões, passando para R$ 5,5 bilhões. Em 2021, o número previsto no Projeto de Lei Orçamentária da União (Ploa) já tinha um corte de 18% (aproximadamente R$ 1 bilhão), que foi agravado nesta semana com a retirada de mais R$ 120 milhões na apreciação do relatório setorial na Comissão Mista de Orçamento (CMO) da Câmara dos Deputados. “Isso é de uma gravidade enorme, inviabiliza o funcionamento das universidades, porque muitas delas já se encontram em condições de carregar dívidas do ano anterior, por um orçamento congelado há praticamente 5 anos. Agora teremos R$ 1.180 bilhão a menos, num cenário onde os custos certamente crescerão em função das adequações para o retorno presencial. Um orçamento que precisa crescer, diminui”, analisou Edward.
Na assistência estudantil, o corte é de aproximadamente 20%, o que representa R$ 237 milhões a menos. Nesse contexto, Edward destacou que 25% dos estudantes das universidades federais vêm de famílias com renda per capita inferior a meio salário mínimo e 50% deles, com renda per capita inferior a um salário mínimo. A assistência estudantil contempla auxílios como bolsa alimentação, bolsa moradia e assistências diversas. “É esse o cenário, a universidade está ameaçada de fechar por não conseguir pagar suas contas básicas ao longo desse ano”, resumiu o reitor da UFG.
Prejuízos
Quando perguntado se o corte ameaça a realização de pesquisas nas universidades federais e quantos projetos estariam ameaçados, o reitor da UFG analisou: “O prejuízo é incalculável para o país. O que nos traz aqui hoje é justamente essa ameaça concreta, porque já existem universidades funcionando com mandado judicial em relação à empresa de energia. A situação é gravíssima. O que ameaça é o sistema de pesquisa nacional, pois grande parte da pesquisa no Brasil está nas Instituições Federais de Ensino Superior. Não dá para dizer exatamente quantas pesquisas foram interrompidas, mas eu diria que todas estão, de certa forma, ameaçadas”.
Evasão
Sobre o risco de aumento da evasão, Edward explicou que a estimativa do Fórum de Pró-Reitores de Assistência Estudantil é de que o Plano Nacional de Assistência Estudantil (Pnaes), para atender os estudantes vulneráveis que estão hoje nas universidades federais, teria que ser da ordem de R$ 1,5 bilhão. “Com quase 20% a menos de Pnaes, sem dúvida o impacto na evasão é imediato. Ou serão reduzidos o valor das bolsas, o número de bolsas ou o tempo de bolsas. Em qualquer hipótese dessa, com um custo de vida crescente, imagine o que isso impacta na vida do estudante que vem de uma família de baixíssima renda e que tem sua bolsa cortada, reduzida ou não paga. A evasão é consequência imediata dessa redução do orçamento das universidades e também do orçamento do programa de assistência estudantil”, afirmou o reitor.
José Daniel Diniz Melo, reitor da Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), complementou: “Esse período de pandemia trouxe também outras necessidades para a assistência estudantil, como por exemplo auxílio para estudantes poderem adquirir algum equipamento para acompanhar aulas remotas. E nós estamos com a entrada de novos estudantes com necessidade de recursos para esse tipo de ação”.
Hospitais Universitários
Em relação aos reflexos dos cortes orçamentários no funcionamento dos Hospitais Universitários, o reitor da UFG explicou que o financiamento das atividades do dia a dia dos hospitais vem do Sistema Único de Saúde (SUS), então os recursos para essas unidades não estão no montante do orçamento das universidades. Porém, Edward lembrou que a situação dos hospitais universitários no país é diversa: “Tem hospital universitário no país que a conta de energia é paga pela universidade. Então temos situações diversas, não dá para generalizar. Alguns hospitais estão hoje um pouco mais independentes do financiamento da universidade no dia a dia, outros não”.
A reitora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Denise Pires de Carvalho, contou que a instituição tem nove unidades de saúde que são dependentes do orçamento da universidade. Ela destacou ainda que houve um acréscimo do volume de atendimentos: “O que nós vimos nos nossos hospitais no último ano foi um aumento importante do fluxo de pacientes com a covid-19. Precisamos destinar leitos para esses pacientes, muitos em isolamento, e isso aumenta muito o custo do tratamento. Não houve diminuição do atendimento das outras doenças, houve um acréscimo das atividades dos nossos hospitais. Precisávamos estar discutindo um aumento do nosso orçamento, não uma diminuição”.
Orçamento
Outra questão que agrava a questão orçamentária das universidades federais e que foi abordada na coletiva, é a divisão do orçamento em um montante liberado e outro montante bloqueado, condicionado à aprovação da quebra da regra de ouro. O 1º vice-presidente da Andifes, Marcus David (UFJF), explicou que a regra de ouro proíbe que o poder executivo possa realizar endividamento para cobrir despesas correntes de manutenção da sua estrutura. Segundo ele, desde 2019 as contas públicas têm levado à necessidade de endividamento para cobrir despesas correntes. “Conforme a Constituição, isso só pode ser feito com autorização expressa do poder legislativo. Então desde o ano passado o governo está dividindo o orçamento de todos os órgãos do poder executivo em dois grupos. Hoje, nas universidades, no orçamento de custeio, 40% está liberado e 60% condicionado a uma aprovação futura do Congresso para quebra da regra de ouro”, afirmou o reitor da Federal de Juiz de Fora.
De acordo com Marcus David, quando o orçamento não é aprovado no ano anterior, é possível executar 1 doze avos do valor do PLOA, e como 60% é bloqueado, o governo só poderia liberar 1 doze avos dos 40%. “Mas o governo está liberando um dezoito avos e as universidades estão recebendo o equivalente a pouco mais de 2% do orçamento do mês. Isso está gerando um problema de fluxo de caixa seríssimo para as universidades, com contas se acumulando, atrasando”, alertou o reitor da UFJF. Ele ainda informou que na assistência estudantil foram liberados 20%.
No encerramento da coletiva, o reitor da UFG voltou a destacar a gravidade da situação orçamentária das universidades federais diante do aprofundamento dos cortes, que segundo ele já eram “dramáticos”. “Agora a gente precisa reverter essa situação. A gente espera que consigamos sensibilizar os parlamentares para que os cortes sejam revertidos, para que as pesquisas continuem, a educação superior de qualidade continue,e a inclusão feita nas universidades, que ajuda a transformar esse país, possa seguir seu curso, com orçamento justo para as universidades”, finalizou Edward.
Também participaram o reitor da Universidade Federal do Tocantins (UFT), Luís Eduardo Bovolato, do Sul da Bahia (UFSB), Joana Angélica Guimarães, que é 2ª vice-presidente da Andifes, o reitor da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Paulo Afonso Burmann (UFSM), da Federal de Roraima (UFRR), José Geraldo Ticianeli e da Federal de Santa Catarina (UFSC), Ubaldo Cesar Balthazar.
Fonte: Reitoria Digital/UFG