
Ex-ministros lançam manifesto em defesa da educação, ciência, tecnologia e inovação
Reitor Edward Madureira participou do lançamento representando a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes)
Texto: Ana Paula Vieira
Nesta terça-feira (2/3), onze ex-ministros de Ciência e Tecnologia lançaram um manifesto em defesa da Educação, Ciência, Tecnologia e Inovação no País. O evento ocorreu por meio de live no canal da Sociedade Brasileira pelo Progresso da Ciência (SBPC) no Youtube e o reitor da UFG, Edward Madureira, participou como presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes).
Assinaram o documento: José Goldemberg, José Israel Vargas, Luiz Carlos Bresser-Pereira, Ronaldo Sardenberg, Roberto Amaral, Sergio Rezende, Aloizio Mercadante, Marco Antonio Raupp, Clélio Campolina, Aldo Rebelo e Celso Pansera. Clique aqui para ler o Manifesto. Sergio Rezende fez a leitura do texto, que manifesta “profunda preocupação diante das ameaças à Educação, à Ciência, Tecnologia e Inovação, decorrentes dos graves cortes orçamentários propostos para 2021, com descontinuidade de programas estratégicos e risco de colapso de instituições do Sistema Nacional de CT&I – retrocesso sem precedentes na história das políticas nacionais”.
Em sua intervenção, o reitor da UFG destacou o valor da ciência brasileira mesmo diante de ameaças como os cortes orçamentários. Segundo ele, a autonomia universitária e o financiamento das universidades estão sob ataque: “Nosso orçamento está congelado. Há pelo menos 5 anos não tem reajuste. Para piorar, o projeto de lei orçamentária para 2021 reduz em 18%. As universidades não terão condições, num espaço de tempo muito curto, de pagar suas contas de energia e manter suas atividades básicas funcionando. Não é mais possível absorver”. Edward também ponderou que a situação leva a uma fuga de cérebros do Brasil e que o país está em fase crítica na questão da pirâmide populacional, pois a quantidade de jovens na base da pirâmide está começando a diminuir. “Temos apenas em torno de 18% dos jovens de 18 a 24 anos nas universidades. O Plano Nacional de Educação (PNE) projetava, para 2024, 33% desses jovens na educação superior. Com a redução desse número de jovens, daqui a pouco não adianta mais investir em educação, ciência e tecnologia”.
Dos signatários, seis ex-ministros estiveram na live. Eles debateram temas como a necessidade de o Brasil ter um projeto de desenvolvimento e a importância de defender algumas pautas no Congresso Nacional, como a derrubada dos vetos à Lei Complementar nº 177, sobre os recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT).
Visão desenvolvimentista
Bresser-Pereira destacou que o Brasil “é um país que está semi estagnado há 40 anos”. Segundo ele, o crescimento do País nesse período de 40 anos foi de 0,8% ao ano per capita, enquanto que nos países ricos o índice foi de 1,5% per capita e dos demais países em desenvolvimento, especialmente dos países asiáticos, chegou a 3%. “O Brasil tem ficado para trás dramaticamente”, afirmou o ex-ministro. Para ele, o atraso brasileiro tem sido causado por uma “ortodoxia liberal”: Ao mesmo tempo em que acho fundamental que o Congresso repense e discuta nosso orçamento para que isso seja minimamente revisto, acho fundamental que essa comunidade de Ciência e Tecnologia lute também na área econômica, a favor de uma visão desenvolvimentista ao invés de liberal, que defenda uma intervenção moderada mas clara do Estado na economia e uma posição nacionalista no plano econômico”.
Projeto nacional
Para o ex-ministro Roberto Amaral, falta ao Brasil um projeto nacional. “Temos que ter claro conosco e passar essa clareza para a sociedade, de que a questão da ciência e tecnologia, embora importantíssima, não encerra a tragédia toda. A tragédia está na política neoliberal. Precisamos conquistar a sociedade para a defesa da ciência e tecnologia como um dos instrumentos de construção nacional. Mas temos que entender essa defesa da ciência, de recursos, da independência da cátedra, da pesquisa, não são fatos autônomos, elas dependem de uma reconstrução desse país”, analisou Amaral.
Avanços ameaçados
O ex-ministro Aloízio Mercadante enumerou alguns avanços recentes da educação, ciência e tecnologia no País: ampliação de vagas e matrículas, expansão do Reuni [Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais], o Enem [Exame Nacional do Ensino Médio], Lei de cotas, Prouni, aumento de 97,7% dos cursos de mestrado e doutorado aumentaram entre 2003 e 2015, crescimento de 107% de estudantes na pós-graduação, aumento da jornada escolar na Educação Infantil, Programa Ciência sem fronteiras e expansão de recursos para a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e para o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Cnpq), entre outros. “Tudo isso está ameaçado nesse momento. É insustentável manter o sistema de ciência, tecnologia e inovação com o orçamento arrochado. Produto de uma visão neoliberal e ortodoxia fiscal permanente imposta pela Emenda Constitucional 95 e que esse país terá que revisitar e repensar a política de responsabilidade fiscal”, ponderou o ex-ministro.
Investimentos internacionais
Clélio Campolina abordou dados de recursos investidos em ciência e tecnologia em outros países: “Estamos diante da maior corrida científica e tecnológica da história mundial: em 2018, se investiu mais de 2 trilhões de dólares em ciência, pesquisa e desenvolvimento. O destaque é, primeiro, um grande esforço da Europa em recuperar o tempo perdido, mas a corrida asiática é algo desproporcional: a Ásia está investindo 44% do total de recursos em ciência e tecnologia do ano de 2018”, afirmou. Ele ainda exemplificou o gasto relativo na área de pesquisa e desenvolvimento: Coreia e Israel lideram com 4,3% do PIB (em 2018), Japão 3,5%; Alemanha e EUA cerca de 3%; China aproximadamente 2%. “O Brasil chegou, segundo estatísticas internacionais, a 1,17%. Agora ninguém sabe, mas seguramente abaixo de 1%. Ou seja, nossa posição é dramática”, alertou o ex-ministro.
Cortes
Celso Pansera enfatizou que há uma linha de corte temporal perceptível pelos ex-ministros que assinam o manifesto: “Desde 2016 não temos ninguém no manifesto. Isso porque teve uma linha de corte na história da educação, ciência e tecnologia brasileira, que vinha há 30, 40 anos, num crescimento e de repente há um corte que não é só do investimento, mas na compreensão da importância da ciência, tecnologia, inovação e educação para a construção de uma nação soberana”. Ele ainda sinalizou pautas em tramitação no Congresso Nacional que impactam no sistema, como a Emenda Constitucional 186, os vetos à lei complementar 177 e a proposta orçamentária.
Entidades
Além dos ex-ministros, representantes da SBPC e da Academia Brasileira de Ciências (ABC) também participaram do evento. O presidente da SBPC, Ildeu Moreira, concordou com os participantes quanto à derrubada dos vetos ao FNDCT, à necessidade de construção de um projeto de país e à crítica à visão econômica neoliberal. Ele ainda apontou um desafio: “Resistir contra essa onda anticientífica, contra o negacionismo, a favor da liberdade de pesquisa, mas precisamos ao mesmo tempo avançar. Fazer uma ciência mais conectada com os grandes interesses do país, promover uma renovação das nossas instituições, melhorando a educação básica. Aprimoramento do sistema de ciência e tecnologia é uma tarefa que temos que fazer ao mesmo tempo em que lutamos”. A vice-presidente da SBPC, Fernanda Sobral, também destacou a necessidade de se pensar em uma política econômica, para além da ciência e tecnologia, e reforçou a importância da derrubada dos vetos ao FNDCT.
O presidente da ABC, Luiz Davidovich, ressaltou que o ato mostra que a defesa da ciência e tecnologia é uma ação suprapartidária e afirmou: “A única maneira de tentarmos mudar esse futuro, ainda que parcialmente, é que a sociedade se mobilize, a comunidade científica se mobilize. O país precisa de um plano nacional de desenvolvimento, um projeto para o futuro”. Helena Nader opinou: “A educação está sucumbindo. É trágico, eu não esperava ver esse Brasil que tanto amamos e que estava numa escalada, sucumbir. É por isso que estamos aqui hoje, então quero agradecer a cada um dos senhores, ministros de diferentes governos, diferentes partidos”.
Clique aqui para assistir a live na íntegra.
Source: Reitoria Digital/UFG
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